20 X 42.195 metros e a primeira major

30/10/2015 15:50

20 X 42.195 metros e a primeira major.

O título era previsível... Afinal, impossível negligenciar as marcas de quantidade e de qualidade. Eu participava da vigésima maratona e estava debutando no honroso grupo das principais maratonas do mundo, as chamadas majors.

Todos são cheios de elogios para a prova e para a cidade. Em breve, eu estaria militado no mesmo grupo. Horas depois da linha de chegada, eu já mandava emails e estimulava amigos para empreitadas futuras pelas ruas da cidade dos ventos.

Policiamento em larga escala e revistas antes dos guarda-volumes. Entre neve e forte calor, tudo é possível. Esteja preparado! O clima em Chicago é sempre uma surpresa. E assim eu estava. Os dias anteriores indicavam um calor acima do normal no final, temperatura excelente na maior parte do tempo.

Largada mais organizada que nossas melhores provas de 10 km. Banheiros de fácil acesso e possibilidade de aquecimento, que no frio é ainda mais importante. Os arranha-céus do centro da cidade bloqueavam o sol, que surgia aos poucos, e canalizavam o vento. Algum frio na sombra, algum calor no sol.

A energia das milhares de pessoas que se aglomeravam pelas ruas era contagiante. A trilha sonora rock and roll completava o quadro estimulante. Eu estava numa major, bem treinado ou nem tanto, queria dar o meu melhor naquele dia!

O coadjuvante esportivo do Diário de um Corredor também estava na prova: Marco Barcelos. Na meia maratona que disputamos uma semana antes, eu não tive qualquer chance. Em Chicago, ele manteve a conversa mole característica de “curtir a prova”, “completar”... Seu desafio era o índice pra Boston (sub 3 horas e 25 minutos para a sua categoria já menos jovem). Uma contusão não permitiu sua preparação ideal, mas agora o problema estava sob controle. Eu tive tempo e oportunidade, mas não consegui evoluir nos treinos como desejado. Estava cansado e lento. Mais um desafio estava posto. Até estabeleci formalmente uma meta (vide textos anteriores), porém a única certeza era correr no meu limite. 

Largada! O GPS do relógio se perdeu na selva de pedra que é o centro de Chicago. A distância indicada no pulso era consideravelmente maior que a das placas. A velocidade apontada também era compatível com erro. Afinal, eu conseguia correr próximo do trajeto ideal. Completei a metade inicial rigorosamente no planejamento ousado. O desafio era manter o ritmo. Vamos!

No quilômetro 33, passo o Dean Karnazes e sigo forte. Ah?! Quem?! Como assim?! Falo do famoso ultramaratonistas americano. Mais ou menos um Márcio Vilar gringo. Sim, ele corria como quem faz um passeio, assediado pela multidão, e talvez a maratona tenha sido apenas uma parte da quilometragem do dia. Pouco importa, “para efeito de registro histórico, eu fui o mais rápido” penso em tom de brincadeira.

De volta à longa Avenida Michigan do início. Última milha: esqueço o relógio. Coração e raça, ao ataque! Acelero o possível. Últimos 400 metros, apenas sigo. Uma curva à frente e voltamos ao parque da largada. Eu duelando com os segundos e surge uma pequena subida! Em condições normais, bobagem... Disputando cada fração de tempo, era desesperador. Uns segundos a mais e meu recorde pessoal continuaria intacto. Seria outra bola na trave. Não sabia os segundos exatos da marca desejada. Palpitava que a marca vigente era 3 horas 22 minutos e uns 30 segundos... A garantia era concluir no minuto anterior. Um “quase” seria um detalhe que não cabia naquele dia... Vejamos o que me aguarda...

Ufa! À noite, verifiquei que melhorei meu tempo em exatos 16 segundos. Esse foi meu resultado mais surpreendente em provas. Realmente incompatível com marcas recentes. Acho que acordei num dia inspirado! Ah, curioso sobre o resultado de uma eventual disputa? Eu diria que deu zebra... Liderei do primeiro ao último metro. :)